Até que ponto a concorrência na Internet é livre?
No dia 11 p.p., em razão de questionamentos formulados pela Microsoft, como proprietária do Bing, e pela controladora do Buscapé e do Bondfaro, o CADE instaurou processos para apurar supostas práticas anticompetitivas do Google. Em cena, o julgamento sobre privilegiar resultados de buscas, restringir anúncios de concorrentes, e fazer scraping (“raspagem”) de comentários de usuários em outros sites. Em outra frente, o Congresso se debruça sobre a iminente votação do Marco Civil da Internet sob o fogo cruzado dos debates sobre se empresas de mídia podem ou não favorecer os seus próprios clientes regulares, prestando-lhes serviços mais eficientes, em detrimento de outros usuários. Pergunta-se: até que ponto é legal a livre concorrência na Grande Rede?
No passado, o CADE decidiu sobre “arenas de negócios” (e-marketplaces), determinando que concorrentes observem certas restrições quando queiram colocar no ar um portal do qual sejam co-proprietários e onde compartilhem informações, prevenindo que essa iniciativa se transforme em plataforma para cartel. No futuro, o mesmo CADE será chamado a bater o martelo sobre se a TV digital é um mercado apenas para emissoras de televisão ou se é de qualquer outra empresa, como as telefônicas. Isso, sem falar na decisão sobre se pagamentos via celular são um mercado privativo de bancos, de telefônicas, ou de ambos.
Como se pode ver, a Internet como “terra de Marlboro” deixou de existir, ante as várias definições a caminho, sobre o que se pode e o que não se pode fazer em matéria de competição na Rede. A propósito, é possível fazer algum prognóstico de tendências quanto a essas definições?
Com a ressalva de que algumas delas remetem a opções de políticas públicas, que não necessariamente seguem uma lógica única, parece razoável considerar alguns precedentes. Por exemplo, o scraping foi condenado em certos contextos tanto em outros países (como o caso do E-Bay contra o Bidders Edge, julgado nos EUA) quanto no Brasil (no caso da Curriculum contra a Catho, julgado em São Paulo). Portanto, colocar robô eletrônico para varrer sites de concorrentes e “pescar” conteúdo deles é uma prática, neste momento, de maior risco, em situações gerais.
Impedir tecnicamente que os usuários possam livremente escolher produtos ou serviços concorrentes é outra conduta já reprimida antes em outras paragens e que poderá vir a sê-lo também no quadro local. Basta lembrar da decisão das autoridades norte-americanas que vetaram o impedimento pela Microsoft de que os usuários continuassem com a alternativa de uso do Netscape quando instalassem o Internet Explorer.
O uso de marcas de concorrentes como chamariz de resultados de buscas é algo também já analisado na jurisprudência dos tribunais, principalmente no exterior. A publicidade patrocinada que pega carona em marca famosa de um concorrente incluindo-a como metatag no código do site é algo que enfraquece a marca de terceiros e promove o desvio de clientela, caracterizando assim dupla infração: violação de direito de marca, e concorrência desleal.
Superproteção na Internet? Não, trata-se apenas de reconhecer que o que se pratica nela não escapa do que já existe como parâmetro no mundo off-line. O amadorismo romântico dos ideais libertários dos primeiros tempos está esbarrando cada vez mais nos legítimos interesses de concorrentes no mercado. A configuração exata dos resultados que estão por vir é imprevisível, mas já dá para perceber que é preciso separar o joio do trigo na hora de selecionar as táticas competitivas, especialmente no tocante a SMM, SMO, SEO e SEM: a otimização do marketing via redes sociais e mecanismos de buscas é uma realidade que veio para ficar, porém os enquadramentos cíveis, administrativos e criminais da legislação sobre abuso do poder econômico é um freio e contrapeso que deve ser levado em conta no planejamento estratégico de quem se aventura a fazer negócios no comércio eletrônico.
Leave a comment